ONDE QUERO DEIXAR MEU REFLEXO

A decisão foi tomada em setembro do ano passado, quando não tínhamos ainda nem sinal da revolução que 2020 nos traria e hoje, mais do que nunca, tenho certeza de que foi acertada. Para mim, minha filha, nossos cachorros, uma vida mais tranquila, cercada de verde, com direito ao canto dos pássaros e dos galos também, já que a casa veio com 1 galo, 4 franguinhos em fase de crescimento, 25 galinhas e 2 cabras, Bárbara e Melody.

O estúdio e galeria da Yankatu irão conosco, o espaço permite e esses meses de isolamento me fez ter certeza de que não faria sentido mantê-lo em São Paulo, pelo contrário, quero proporcionar aos que me visitam o mesmo privilégio que terei, ar puro, frutas colhidas no pomar e um belo pôr do sol. Então não se preocupem, assim que estivermos instaladas por lá, o estúdio voltará a abrir as portas para recebe-los com hora marcada, bolinho e café.

E enquanto toda essa preparação acontecia, o trabalho que no meu caso se chama paixão, continuou com força total. Em agosto, na MADE, lancei a coleção Xingu, que nasceu a partir da minha vivência na Aldeia Kaupüna, no Alto Xingu, em dezembro passado e claro, com a ajuda e o trabalho maravilhoso do Stive (Kulikyrda Mehinako) e de suas irmãs.

Junto com eles desenvolvi também o Balanço Kaupüna, criado para o Leilão da Artesol, visando ajudar levantar recursos para que ela possa continuar desenvolvendo seus incríveis projetos em benefício dos artesãos brasileiros. Um balanço que para mim é um marco por se tratar da primeira peça feita pela etnia Mehinako que une os trabalhos dos homens com a madeira e das mulheres com o trançado de fios de buriti. Como eles mesmo disseram, é um “novo produto indígena”! Demais, né?  Ainda custo a acreditar que tudo isso faz parte do caminho que resolvi trilhar ao dar ouvidos ao meu coração.

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Meus passos me levaram a tantos lugares, aprendi tanta coisa, ensinei tantas outras, numa troca constante e transparente que resultaram em trabalhos com alma e amigos pra vida.

Nesse caminhar portas se fecharam, mas tantas outras se abriram. Este sábado será a abertura da exposição Sentar Ler Escrever da qual tenho a honra de participar como artista apresentando a obra construída a quatro mãos com o Stive, mostrando que não há distância ou pandemia que nos impeça de realizar sonhos, de compartilhar, de construir juntos um futuro melhor.

A exposição faz parte da 3ª edição do projeto Circular Arte na Praça Adolpho Bloch, uma iniciativa da Farah Service que visa desde o início provocar uma reflexão sobre a relação do homem com a natureza, seu entorno e a arte.

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Onde eu quero deixar meu reflexo é uma obra que visa nos colocar frente a frente com uma questão atual e primordial, nos convida a uma pausa para sentar e pensar, ler o que não necessariamente está escrito em palavras e escrever por meio das nossas atitudes uma história com final mais feliz.

Quando partimos desta vida, não importa crença, raça ou posição social, nós não levamos nada conosco, mas deixamos para trás o reflexo das nossas escolhas. Afinal, onde você quer deixar seu reflexo?

Espero vocês lá!

Com muito carinho,

Maria Fernanda Paes de Barros